| No Mercosul, o que importa não é a gravidade dos conflitos 
        comerciais, mas sim a capacidade de superálos de forma racional. 
        Quanto mais intensa a relação entre os sócios, mais 
        natural que ocorram conflitos comerciais. Prova disso são a experiência 
        européia das últimas décadas, a transatlântica 
        entre os EUA e a União Européia e a dos países que 
        integram o Nafta. Nesses casos, os países sócios procuraram 
        esboçar regras de jogo claras e instituições eficazes 
        -especialmente para resolver as disputas que têm sua origem na intérpretação 
        das regras ou no alcance das medidas internas.  O Mercosul também possui mecanismos de resolução 
        de controvérsias, que são pouco utilizados. A única 
        decisão de um tribunal de arbitragem foi em abril passado e em 
        conseqüência dela a Argentina considerou, que determinadas 
        medidas adotadas pelo Brasil contrariavam o que havia sido combinado. 
        Há outros casos. Recorrer a eles não enfraquece o Mercosul. 
        Pelo contrário, o fortalece. Recentemente o governo argentino adotou duas medidas que geraram a impressão 
        de refletir tendências protecionistas é de ser contrárias 
        ao que foi acordado. A primeira é a resolução 861 
        do Ministério da Economia, pela qual determinase proteção 
        aos tecidos de algodão. Pela média, as cotas estabelecidas 
        não afetarão as correntes recentes de importações 
        originárias do Brasil, que em 1998, atingiram US$ 50 milhões. 
        Tratase de uma medida prevista nà OMC (Organização 
        Mundial do Comércio). Não existe no Mercosul nenhuma norma 
        que impeça um sócio de adotar medidas désse tipo, 
        como existe, no caso das proteções do artigo 19 do Gatt 
        (Acordo Geral de Tarifas e Comércio) de 1994.  Quando a Argentina aplicou proteções aos calçados, 
        excluiu o Brasil, que hoje é o principal exportador ao país, 
        porque havia um compromisso explicito do Mercosul (decisão 17/96) 
        que assim estabelecia. Essa norma do Mercosul claramente exclui os têxteis 
        de seu âmbito. Foi por isso que o governo argentino não teve 
        base legal para excluir o Brasil de uma medida solicitada, em conformidade 
        com a legislação vigente, pela entidade empresarial que 
        representa o setor. Tudo isso foi devidamente explicado às autoridades 
        bràsileiras competentes antes da adoção da determinação. A segunda medida é a resolução 911 do Ministério 
        da Economia dá Argentina. Ela estabelece procedimentos com relação 
        a uma medida, existente na Aladi (Associação Latinoamericana 
        de Desenvolvimento e Integração), para a eventual aplicação 
        de salvaguardas nos acordos que sejam celebrados em seu âmbito, 
        e que não contenham normas espécífiças. Não 
        cria um direito más regulamenta um direito existente. Não 
        faz menção ao Mercosul nem a nenhum outro acordo dos vários 
        que a Argentina tem na Aladi. Não seria aplicável se existissem, 
        no Mercosul, normas próprias para a matéria. Elas não 
        existem. Existiram até 1994. A Argentina sugeriu, inclusive recentemente, que seria conveniente o 
        Mercosul dispor de mecanismos próprios para resolver problemas 
        graves, que pudessem surgir com relação a um produto ou 
        a um setor, em conseqüência de uma desvalorização 
        anunciada. Isso tem lógica. Existem ou já existiram mecanismos 
        semelhantes na União Européia e no Nafta. Eles conferem 
        flexibilidade às regras do jogo. O Mercosul atende ao interesse estratégico de todos os seus sócios. 
        É muito mais do que comércio -implica confiança e 
        benefícios mútuos. Num mundo globalizado, é a melhor 
        opção, tal vez a única inteligente. Aumenta a capacidade 
        de atrair investidores è de negociar na OMC, com os EUA, com a 
        União Européia. Para isso precisa ter credibilidade. A diplomacia 
        de integração requer mais do que uma linguagem dura, um 
        diálogo racional e até silencioso. Não convém 
        a cada conflito criara imagem de que o que está em jogo é 
        o próprio Mercosul. Se as regras não são claras ou 
        existem vazios legislativos que afetam interesses legítimos, é 
        preciso negociar novas regras. Se existem dissidências, ou controvérsias, 
        é preciso utilizar os mecanismos existentes. Se eles não 
        funcionam bem, é preciso aperfeiçoálos. O mercado 
        comum existe para isso. Òs empresários podem colaborar apresentando propostas concretas, 
        como fez há pouco o então senador Fernando Bezerra, na condição 
        de presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria), 
        ou selando acordos setoriais, como ocorreu em vários casos, mas 
        não num setor tão sensível como o dos calçados 
        no qual as importações vindas do Brasil aumentaram 71% nos 
        seis primeiros meses deste ano, apesar de o comércio bilateral 
        total ter apresentado uma queda de quase 28%. |